A polêmica do ICMS para 1995

Com o Plano Real, criou-se uma confusão estéril sobre alguns indicadores básicos que avaliam o comportamento da receita tributária, notadamente o ICMS e seu critério de deflacionamento. Os equívocos foram ampliados com a veiculação de uma suposta superestimação do ICMS na Proposta Orçamentária para o ano de 1995. O objetivo desse texto é esclarecer essa questão do ponto de vista técnico, resgatando alguns princípios básicos de estatística econômica esquecidos em meio a essa polêmica.

De imediato, convém lembrar que, em outubro, o ICMS nominal atingiu a cifra de R$ 270,2 milhões, indicando crescimento real de 31,22% sobre o mesmo mês do ano anterior, medido pelo IGP-DI mensal, da Fundação Getúlio Vargas. No acumulado dos dez primeiros meses do ano, comparativamente a igual período de 1993, o crescimento real é de 5,86%, equivalendo a uma arrecadação real de R$ 2,319 bilhões (a preços de outubro de 1994). Os números até aqui contabilizados permitem esperar para 1994 a arrecadação de R$ 2,851 bilhões, ou incremento real de 8,14% em relação ao volume arrecadado em 1993.

Esse comportamento positivo do ICMS é influenciado pela expansão esperada da atividade econômica, principalmente o consumo. Como se observa, tecnicamente, para se apurar o crescimento estimado de 8,14% para 1994, utilizou-se a tradicional série do IGP-DI, coluna 1, da FGV, o qual contempla a inflação residual de 24,7% referente a julho de 1994, nó górdio da questão. A não utilização dessa série distorce, sobremaneira, toda a análise real e histórica do comportamento do ICMS do RS. Para 1995, segundo a Proposta Orçamentária, está previsto um ingresso de R$ 3.092 bilhões referente ao ICMS total (a preços de outubro/94).

Este valor sinaliza um crescimento real de 8,43% sobre 1994, bem diferente do percentual de 45,8% veiculado pela imprensa. Esse desempenho previsto possui consistência técnica, desde que se mantenha o quadro de estabilização e a redução drástica do efeito Tanzi (queda da receita em virtude da inflação incidente no período entre o fato gerador e o ingresso nos cofres públicos). É bom lembrar que a previsão da receita exige a elaboração de cenários macroeconômicos e, nesse caso, apostou-se em um quadro de estabilização.

Assim, julgamos que a polêmica travada em torno de uma suposta superestimação da receita de ICMS carece de consistência, incorrendo em equívocos triviais do ponto de vista da técnica orçamentária. Em primeiro lugar, compara simplesmente os valores orçados do ICMS, para 1995, contra os de 1994, desconhecendo a conjuntura econômica em que ambas as propostas foram elaboradas. Esquece-se, por um passe de mágica, da existência do Plano Real, do aquecimento do consumo e do conseqüente incremento da arrecadação a ser obtido em 1994.

Em segundo lugar, consideramos equivocado se utilizar diretamente o dólar como deflator para converter a moeda nacional, em função de que a evolução dos preços internos é distinta da do câmbio, gerando várias distorções às séries temporais. O professor Dércio Munhoz, da Universidade de Brasília, já demonstrou que é recomendável corrigir os valores nominais por um índice de preço interno, para somente depois se utilizar a conversão pelo câmbio. Esses equívocos espelham, desse modo, a confusão reinante quanto às técnicas de previsão da receita. Uma leitura atenta da Mensagem do Governador, elaborada pelo Gabinete de Orçamento e Finanças, teria, com certeza, ajudado a dissipar essas dúvidas levantadas. Inclusive, não seria de admirar que o ICMS orçado para o ano vindouro venha a ultrapassar o previsto, desde que o futuro Presidente realize as mudanças estruturais necessárias, mantenha a sintonia fina da política econômica e exerça o controle eficaz da oferta monetária.

CALAZANS, Roberto B.; SIMONETTI, Valmor Braga. A Polêmica do ICMS para 1995. Finanças em Linha, Porto Alegre, Associação dos Auditores de Finanças Públicas do RS, novembro/94, Ano I, n.º 5.

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