Orçamento 2026: redefinindo a trajetória fiscal

A apresentação da Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2026 pela Prefeitura de São Leopoldo, em audiência pública realizada em 14 de novembro, evidenciou um conjunto articulado de iniciativas voltadas à recomposição das contas públicas e ao fortalecimento da capacidade financeira do município. O diagnóstico elaborado pela Secretaria da Fazenda demonstra que, desde 2017, o município enfrenta um quadro persistente de insuficiência de caixa, acúmulo significativo de restos a pagar e pressões estruturais que comprometeram sua solvência e reduziram substancialmente a margem para investimentos. Esse panorama foi sintetizado pela gestão na metáfora do “Everest” da dívida bancária, utilizada para ilustrar a magnitude do passivo financeiro herdado e as restrições impostas ao planejamento fiscal de médio prazo.

Diante desse cenário adverso, a administração municipal conduziu, ao longo de 2025, um amplo processo de modernização fiscal, orientado à recomposição da capacidade de gestão das contas públicas e à consolidação de bases institucionais mais sólidas para o equilíbrio intertemporal. A aprovação da Lei da Liberdade Econômica e da Lei de Responsabilidade Fiscal Municipal, somada à implementação do planejamento orçamentário e do fluxo de caixa anual, representa um marco institucional importante, ao ampliar a transparência das decisões, qualificar o monitoramento financeiro e induzir maior racionalidade na execução das despesas.

Esses instrumentos foram acompanhados de iniciativas de modernização administrativa, como a digitalização de processos, a adesão à Nota Fiscal de Serviços Eletrônica Nacional e a renegociação de contratos bancários com a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil. Adicionalmente, a execução do programa de regularização tributária (Refis) proporcionou a entrada de R$ 17 milhões nos cofres municipais, ao mesmo tempo em que a campanha de arrecadação do IPTU registrou desempenho expressivo, contribuindo para a recomposição das receitas próprias.

As projeções fiscais constantes da LOA indicam uma mudança relevante na trajetória das contas públicas. Após registrar déficit primário superior a R$ 100 milhões em 2024, o município projeta superávit de R$ 66 milhões em 2026. A Dívida Consolidada Líquida deve reduzir-se de R$ 568 milhões para R$ 488 milhões, diminuindo a relação dívida/RCL para 36,8% — indicador que sinaliza melhora na solvência fiscal e maior controle sobre despesas obrigatórias. A receita orçamentária total está estimada em R$ 1,63 bilhão, chegando a R$ 1,95 bilhão quando considerados os repasses internos. Mantém-se, contudo, elevada a dependência das transferências correntes, que continuam representando mais da metade do total previsto, ao passo que as receitas de capital tendem a crescer, impulsionadas por operações de crédito e convênios federais voltados a investimentos estruturantes.

A proposta orçamentária para 2026 incorpora inovações metodológicas relevantes, especialmente o uso de modelos de projeção desenvolvidos em linguagem R, que ampliam a precisão das estimativas de receita e permitem alinhar, com maior rigor, expectativas e capacidade financeira real. O orçamento também internaliza as 65 emendas parlamentares definidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e consolida uma abordagem de planejamento por ação, concentrando esforços em áreas prioritárias como saúde, saneamento, urbanização e infraestrutura. No âmbito institucional, destaca-se a decisão de atribuir ao SEMAE a responsabilidade integral pelo micro e macrodrenagem urbana, corrigindo uma distorção histórica apontada pelo Ministério Público, segundo a qual a autarquia realizava a cobrança, mas a execução das obras recaía sobre a Prefeitura.

Entre os investimentos programados para 2026, destacam-se iniciativas estratégicas voltadas à redução de vulnerabilidades socioespaciais e ao aprimoramento da infraestrutura urbana, como a urbanização da ocupação Steigleder, as obras na Bacia Vicentina, a construção de uma nova policlínica e a ampliação do sistema de abastecimento de água na Zona Norte. Essas intervenções, somadas aos esforços em saneamento e drenagem, constituem uma agenda orientada tanto às necessidades imediatas da população quanto à mitigação de gargalos históricos que comprometem a resiliência urbana.

A audiência pública também exerceu papel pedagógico ao esclarecer temas frequentemente debatidos na esfera pública. Reforçou-se que a atualização da Planta Genérica de Valores ocorre apenas a cada oito anos, conforme previsto na legislação municipal, e que a nova Lei de Responsabilidade Fiscal não altera a revisão anual dos servidores nem implica aumento do IPTU. Destacou-se, ainda, que fundos como o FUNDEB e aqueles voltados à proteção da criança e do adolescente são juridicamente indisponíveis, por força constitucional, não podendo ser objeto de desvinculação. Também foi esclarecido que o município não possui propostas de privatização, mas sim de parcerias público-privadas, nas quais a titularidade e a responsabilidade pelos serviços permanecem públicas.

Em síntese, a LOA 2026 foi apresentada como um marco no processo de reorganização fiscal do município, ao expressar a convergência entre planejamento técnico, modernização administrativa e disciplina na gestão das despesas. Embora persistam desafios estruturais que demandam acompanhamento contínuo, o conjunto de ações empreendidas ao longo de 2025 sinaliza a construção de um ambiente de maior estabilidade financeira, fortalecimento institucional e recuperação gradual da capacidade de investimento. Esses elementos são essenciais para assegurar a sustentabilidade fiscal no médio e longo prazo e para viabilizar políticas públicas capazes de responder de forma consistente às necessidades da população.

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