O rombo no caixa único: o uso irregular de recursos públicos

Saiba como o governo estadual e o secretário da Fazenda estão desrespeitando a legislação ao utilizar irregularmente os recursos do Sistema Integrado de Administração do Caixa Único para cobrir o déficit público. As conseqüências desta movimentação irregular são notadas não apenas no Balanço Geral do Estado que se apresenta distorcido, mas também nos órgãos públicos e nas áreas sociais que deveriam, por lei, estar recebendo estes recursos que foram desviados para outros fins.

Veja passo-a-passo como isso aconteceu na gestão pública
atual.
1- O que é o Sistema Integrado de Administração do Caixa do Estado (SIAC), mais conhecido como Caixa Único?

O governo Collares criou em 1991, através do Decreto Estadual n.º 33.959, o Sistema Integrado de Administração do Caixa do Estado, o SIAC, destinado a centralizar em uma única conta bancária as disponibilidades das secretarias de Estado, dos órgãos de Administração Indireta, de empresas estatais, e os recursos provenientes do Governo Federal, de entidades internacionais e de impostos e taxas recolhidos. Antes do SIAC entrar em funcionamento, cada uma destas entidades possuía contas separadas. Desta maneira, não havia como o Estado fiscalizar a movimentação dessas contas, tornando inflexível o direcionamento dos recursos estaduais. O SIAC, desde sua implantação, é administrado pela Secretaria Estadual da Fazenda e executado pelo Banco do Estado do Rio Grande do Sul S.A.
2- Quais as razões que levaram o Governo Collares a criar o SIAC?

A principal razão que levou o Governo Collares a criar o Caixa Único partiu da necessidade de se reduzir o custo financeiro da administração da dívida mobiliária do Estado e maximizar os rendimentos. Nada mais lógico, portanto, do que captar os recursos das entidades que compõem o Poder Executivo e aplicá-los em uma só conta, mantendo os saldos escriturais individualizados.

3- Como ele funciona?

O SIAC é administrado pela Secretaria da Fazenda que gerencia e controla os recursos diários existentes, bem como analisa e aprecia previamente os fluxos financeiros das subcontas que o compõem. O Governo movimenta os recursos do Caixa Único, mas deve estar ciente de que certos recursos possuem restrições de uso. Esses recursos são chamados de recursos vinculados.
4- O que são recursos vinculados?

Existem três tipos de ativos que o Governo do Estado possui: os disponíveis, os vinculados e os realizáveis. Os ativos disponíveis, como o próprio nome diz, são os valores numéricos que estão disponíveis para o Governo utilizar na hora que julgar necessário, ou seja, possuem liquidez imediata. Os recursos vinculados também são valores numéricos, mas diferentemente dos disponíveis, eles chegam na conta do Estado com um destino certo, ou seja, eles têm fins específicos e são regidos por lei para que não sejam utilizados para outros fins. Os ativos realizáveis estão incluídos os créditos de curto prazo (realizados em menos de um ano) e as aplicações financeiras.

5- O que é o uso irregular de recursos públicos?

O Caixa Único foi concebido para obter ganhos financeiros, todavia com a criação da conta resgate passou a ser instrumento de endividamento, financiando o déficit de caixa do Tesouro Estadual. É o que está acontecendo no Governo atual: foram sacados R$ 1,4 bilhão de recursos vinculados do SIAC (Gráfico 1). Esses recursos, porém, como já foi mencionado acima, têm fins específicos e são regidos por dispositivos constitucionais, legais e contratuais que restringem a sua aplicação. E é aí que reside a ilegalidade da movimentação realizada pelo secretário da Fazenda.

6 – O que o administrador pode fazer com os recursos que são depositados no Caixa Único?

O secretário da Fazenda pode movimentar os recursos conforme as determinações legais, que indicarão quais recursos podem ser utilizados e sob que condições. Os recursos vinculados aplicados no Caixa Único não poderiam ser utilizados para outros fins, por que o Decreto criou o SIAC não pode se sobrepor as Leis. Por esta razão, a afirmação do secretário da Fazenda – na audiência de esclarecimentos na Comissão de Finanças e Planejamento
no final de ago./01 – de que o Estado não tem obrigação de repor o dinheiro, é uma afronta à sociedade gaúcha. Ao afirmar isso o secretário de Estado está dizendo que não tem um compromisso com o povo de aplicar o dinheiro, previsto por lei, em educação e saúde, por exemplo. Para explicar melhor: o Governo sacou R$ 132 milhões do SIAC que eram destinados ao Fundopimes (Programa Integrado de Melhorias Sociais) – fundo destinado aos pequenos municípios e as comunidades carentes – para pagar servidores e a dívida pública e diz não ter obrigação legal de repassar estes recursos para essas localidades.

7 – O que a Lei proíbe que o administrador público faça?

Parte dos recursos sacados do Caixa Único, que resultaram no rombo de R$ 1,4 bilhão, eram oriundos das empresas controladas pelo poder público, como a Corsan e a CEEE. O inciso II, do artigo 37, da Lei de Responsabilidade Fiscal, proíbe “o recebimento antecipado de valores de empresas em que o Poder Público detenha, direta ou indiretamente, a maioria do capital social com direito a voto, salvo lucros e dividendos, na forma de legislação.” No inciso I, do artigo 3º, da Resolução n.º 78 do Senado Federal, é dito que: “É vedado aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e às suas respectivas autarquias e fundações, que pleitearam autorização para contratar as operações de crédito regidas por esta resolução: I – captar recursos por meio de transferências oriundas de entidades por eles controladas, inclusive empresas nas quais detenham, direta ou indiretamente, maioria do capital social com direito a voto, ainda que a título de antecipação de pagamento ou recolhimento de tributos.”

Se a operação financeira do administrador público for entendida como adiantamento, haveria a vedação pela resolução e lei acima citadas, com as implicações penais previstas no artigo 2º da Lei dos Crimes de Responsabilidade (Lei Federal n.º 10.028/00).

8 – O que poderá acontecer quando ficar provado que o PT cometeu irregularidades na gestão de recursos do Caixa Único?

O Parecer Prévio do Tribunal de Contas do Estado de 2000 sobre o sistema de Caixa Único afirma que o Governo deve repor os recursos. Se for confirmado através da Subcomissão mista que analisa, na Assembléia Legislativa, a gestão do Caixa Único que houve desvio de recursos vinculados, o Governo terá de repor o rombo do Caixa Único.

9- Quais os prejuízos deste tipo de administração para o Estado do RS? O que o povo perde com isso?

A grande perda do povo gaúcho é constatar que as áreas sociais não estão sendo priorizadas, uma vez que os recursos, assegurados por lei, foram desviados para outros fins. Isso demonstra que o PT foi incapaz de equilibrar as finanças estaduais e impulsionar o crescimento econômico do RS. Se não houver reposição dos recursos do Caixa Único, o próximo gestor iniciará com todas as contas vinculadas pendentes de aplicação e não terá os recursos financeiros para sua execução. Caso não encontre novas alternativas, enfrentará o caminho da ingovernabilidade financeira.

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