Todos sabem que as causas da crise das finanças estaduais são encontradas tanto no lado da receita quanto da despesa. A questão primordial é que o regramento definido pelo Governo Federal limitou o poder de atuação estadual em torno de uma agenda de desenvolvimento e conduziu à política recorrente de cortes de gastos públicos. Passados mais de 10 anos da assinatura dos contratos de renegociação das dívidas dos Estados com o Governo Federal, sob a égide da Lei 9.496, e da adoção do Programa de Ajuste Fiscal, o RS aumentou a geração de resultado primário, contudo ainda exibe baixo volume de investimento e tem uma margem restrita para recuperar os vencimentos dos servidores sem comprometer o equilíbrio fiscal.
A capacidade estadual de ampliar gastos é limitada pelo comportamento da receita tributária e a contratação de novas operações de crédito depende da boa vontade do Governo Federal. A execução do Orçamento Estadual já deixou de ser rígida na prática, pois as vinculações constitucionais de receita não podem ser cumpridas, sob pena de expor um déficit público irreal. No curto prazo, a alternativa viável para valorizar a agenda do desenvolvimento acoplada à política de recuperação fiscal é o aumento da receita tributária.
O ajuste pelo lado da receita não precisa ser realizado mediante aumento de alíquotas de ICMS. É o que vem fazendo a Receita Estadual ao intensificar o regime de substituição tributária em diversos setores da economia, que saltou de 12,5% do ICMS total em 2007 para 18,5% em 2009. O desenvolvimento da Nota Fiscal Eletrônica é outro exemplo que merece destaque. O Fisco também impôs restrições à liberação de crédito às exportações a partir de 2007, reduzindo de R$ 446 milhões para R$ 350 milhões em 2008 e R$ 299 milhões em 2009. Não obstante essas iniciativas, o Estado goza de um potencial de aumento de arrecadação ditado tanto pelo crescimento econômico quanto pela possibilidade de redução da evasão fiscal ou mesmo pelo aumento da eficiência da máquina arrecadadora. Os dados da Secretaria do Tesouro Nacional para todos os estados da Federação confirmam que a receita tributária do RS cresceu abaixo da média nacional entre os anos de 1995 e 2008 e que o Estado ocupa a 24º posição no ranking de crescimento dessa receita no período.
Quando se compara o nível de arrecadação de ICMS em relação ao PIB, o RS ocupa a 19ª posição do País com base em dados do IBGE para os PIB’s estaduais. De outra parte, segundo os dados do Orçamento 2010, as desonerações fiscais alcançam 38,7% da receita potencial, sendo: 39,5% no caso do ICMS, 27,1% para o IPVA e 24,8% para o ITCD. O crédito presumido saltou de R$ 975 milhões em 2003 para R$ 1,941 bilhão em 2008 (13,1% do ICMS arrecadado). O Fundopem – outra forma de concessão de crédito presumido – alcançou o montante de R$ 345 milhões em 2008. Em síntese, as desonerações fiscais (não-incidências, isenções, reduções de base de cálculo, créditos presumidos, microempresas e estornos de crédito fiscal), concedidas no âmbito das legislações estadual e federal, alcançaram R$ 10 bilhões em 2008, desses, R$ 9,6 bilhões são relativos ao ICMS.
Esses números são indicativos de que o ajuste fiscal duradouro, que aumente a capacidade de investimento do Estado e valorize o serviço público, carece de medidas factíveis pelo lado da receita. Uma tentativa de consenso sobre o tema da receita pública na sociedade gaúcha recolocaria em novo patamar as políticas de desenvolvimento e ampliaria os gastos sociais do Estado.
*Artigo publicado no jornal ZH em 28/05/2010.