Análise das finanças do Estado do RS em 2008

No livro “Finanças Públicas: Verdades e Mitos”, editado em 2007, que analisa as finanças estaduais no período 1970 a 2006, na página 216, está assim expresso:

“Depois de muitos anos de análise da situação das finanças públicas de nosso Estado, firmei uma convicção de que a crise só será vencida mediante a conjunção de três fatores: aumento da arrecadação permanente, desvinculação parcial de receita e contenção rigorosa de despesa. Isolados, nem um, nem dois desses fatores resolverão o problema.”

E foi exatamente isso que fez o Governo do Estado. O exercício de 2008 foi um ano atípico, em termos de crescimento da arrecadação, em todos os níveis de governo. O Governo Federal (Tesouro Nacional, INSS e Banco Central) obteve um crescimento nominal de 15,8% ou 9,6%, se descontada a inflação medida pelo IPCA, apesar do decréscimo ocorrido nos meses de novembro e dezembro, em função da crise financeira internacional.

O ICMS, principal item de receita dos estados, cresceu 19,5% nominais ou 13,1% reais no Brasil, no período janeiro/novembro de 2008, comparado com igual período de 2007, segundo dados do CONFAZ. O crescimento real no RS, pela mesma fonte e no mesmo período, foi de 15,24%.
Nesse contexto, os governos que souberam administrar suas despesas e acompanhar e até superar o ritmo nacional de crescimento da receita, conseguiram eliminar seus déficits, como foi o caso do RS.

Situando-se em 4º lugar no “ranking” nacional no crescimento da arrecadação do ICMS, o Estado do RS conseguiu aumentar sua receita de um modo geral, ao mesmo tempo em que conteve o crescimento da despesa. O crescimento real do ICMS arrecadado a qualquer título no RS foi de 14,3%, quando a média do período 1995-2007 foi de apenas 3,4%.

Tomando-se o balanço consolidado do Estado, verifica-se que a receita corrente descontada da parcela do Fundeb e dos municípios cresceu em 2008 11,4% reais, enquanto a despesa expandiu-se em 4,5%. No biênio 2007-2008, para um crescimento da receita corrente líquida de 13,3%, a despesa total cresceu apenas 2,5%. No mesmo período, a despesa com pessoal cresceu 5,1% em termos reais e o serviço da dívida somente 2,4%. As outras despesas correntes, que inclui a manutenção da máquina, decresceram 2,1%. O lado negativo ficou com a queda dos investimentos em 9,2%, mas foi um tributo pago à eliminação do déficit.

Deve ser destacado que o ajuste vem sendo feito há anos. Tomando-se como base o exercício de 2000, constata-se que a relação despesa total/ RCL, que fora de 121,32% naquele ano, desceu para 108,67% em 2006, culminando, finalmente, em 2008, com 98,35%.

Os que contestam o déficit zero o fazem com a argumentação de que ele só foi possível devido ao não-cumprimento das vinculações constitucionais. Na realidade, nos termos da Constituição Estadual (educação) e Federal (saúde) deixaram de ser cumpridos cerca de R$ 1,8 bilhão entre educação e saúde.

Ocorre que para aplicar mais R$ 1,8 bilhão nas vinculações referidas, o aumento da receita corrente da Administração Direta teria que ser de R$ 5,1 bilhões, ou seja, mais 25%, além dos 15% já aumentados (item 2.1.1 da análise).

Deve ser dito, ainda, que antes também não eram cumpridas essas vinculações, a despeito da existência dos déficits. O aumento do percentual descumprido não decorreu de redução do valor aplicado (numerador), mas do aumento da receita (o denominador).
Em se tratando de índices, houve uma redução de dois pontos percentuais na participação dos Outros Poderes na despesa pública, embora os gastos deles tenham crescido 2,8% no biênio.
No tocante à gestão fiscal, houve muitas modificações positivas e negativas, assim resumidas:

a) O resultado orçamentário foi positivo de R$ 442,6 milhões em 2008. Retirando-se as receitas de capital, passou de um déficit de R$ 1,239 bilhões em 2006 para um superávit de R$ 325 milhões em 2008;

b) O resultado primário cresceu de R$ 454 milhões em 2006, para R$ 2.151 milhões em 2008, mais de 370% em dois anos, superando o valor do serviço da dívida;

c) O fato negativo fica com o crescimento do resultado nominal, de R$ 1,908 bilhões em 2006 para R$ 3,544 bilhões em 2008. Como o critério utilizado é o da variação do estoque da dívida, a causa está na sua indexação pelo IGP-DI, que foi um dos índices que mais cresceram.

d) No entanto, a relação dívida consolidada líquida com a RCL reduziu-se, passando a se situar abaixo do limite estabelecido, em quatro pontos percentuais;

e) O déficit previdenciário passou de R$ 3,740 bilhões em 2005 para R$ 4,906 bilhões em 2008, num crescimento real de 4,8% ao ano, constituindo no maior problema do Estado;

f) O estoque de Restos a Pagar decresceu 11,1% reais no biênio e as disponibilidades de caixa antes de sua inscrição reduziram-se em 25,3%, o que denota o ajuste fiscal feito.

Por fim, cabe enfatizar o grande feito do Governo do Estado, que foi a eliminação do déficit histórico. Quatro considerações, no entanto, não se pode deixar de fazê-las:

i) A primeira dela é que os governos anteriores fizeram também a sua parte, reduzindo o comprometimento da receita corrente líquida com o total da despesa, conforme demonstrado;

ii) a segunda foi o crescimento espetacular da arrecadação em 2008, em grande parte, decorrente de um fenômeno nacional;

iii) a terceira é que a eliminação do déficit, ou seja, tornar o fluxo anual de receita superior ao da despesa é a condição “sine qua non” para sair da crise, mas não é a única: resta eliminar o estoque de dívidas formado ao longo dos anos pelos déficits que se acumularam; e

iiii) a queda mais que provável na arrecadação em 2009, cujo crescimento real esperado será nulo ou muito reduzido. Mas, como a curva da receita passou a situar-se acima da despesa, tudo está em fazer com que elas se mantenham nessa posição.

A conclusão final é que se formos cumprir integralmente as vinculações da receita tal qual estão concebidas na legislação, estaremos fazendo a apologia do gasto pelo gasto, e dificilmente chegaremos ao déficit zero assim concebido. Necessitamos de uma mudança de paradigma para medir as realizações dos governos não pelo que gastam, mas pelo que fazem.

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Referência (em PDF):
1.1. Análise das Finanças do Rio Grande do Sul. 2008.

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