O déficit público do RS

Enquanto o rombo financeiro do Estado se aprofunda, o Governo Estadual agarra-se na única medida do déficit público (resultado primário) que mostraria alguma ação consistente de política fiscal. Trata-se de um enorme equívoco, que somente serve para ofuscar o debate sobre as contas estaduais. O resultado primário tem por objetivo é apurar o montante capaz de suportar os encargos a dívida, sendo, por isso, apurado antes das operações de crédito e da dívida. É um conceito bastante utilizado pelo FMI e pelo Banco Mundial e um indicador muito importante, na medida em que a ausência de resultados primários conduz a uma situação de endividamento insustentável.

De fato, em 1998 havia, na Administração Direta do Estado, um déficit primário de R$ 1,0 bilhão que foi reduzido para R$ 96 milhões em 2001. Todavia, é omitido que a causa principal da redução do déficit foi a queda do nível de investimentos e a contenção da massa salarial. Deveria ser dito que os anos de altos déficits primários coincidem com os de altos investimentos, isto é, há uma relação quase que simétrica entre resultado primário e investimentos. Em 1997 e 1998, os recursos de privatização permitiram altos investimentos.

Como a receita de privatização é desconsiderada no cálculo do resultado primário, mas não as despesas com ela realizadas, logicamente que altos níveis de investimentos implicarão altos déficits primários. Quando se exclui os investimentos do resultado primário acima mencionado, constata-se, por exemplo, que o resultado de 1998 (R$ 314 milhões) é próximo ao de 2001 (R$ 466 milhões). Além disso, cabe indagar se as contas estaduais estão equilibradas, como pode o saldo financeiro ajustado do Balanço Patrimonial alcançar um rombo de R$ 3,0 bilhões em 2001, os restos a pagar somarem R$ 1,8 bilhões e o Caixa Único do Estado estar raspado, de forma indevida, com apenas R$ 16,3 milhões de saldo efetivo em 07/03/02.

O trato com as finanças públicas exige responsabilidade e a medida do déficit primário não pode ser usada para mascarar a realidade. Sem desmerecer alguns esforços fiscais do atual governo, carece de fundamento financeiro a afirmativa de que ele reduziu o déficit estrutural do RS. O que houve foi uma queda no nível de investimentos aliada à contenção da folha salarial dos servidores. Apesar da retórica, a política fiscal de hoje está mais para o modelo do FMI do que para o de Keynes.

CALAZANS, Roberto B; SANTOS, Darcy. F.C. O déficit público do RS. Correio do Povo. Porto Alegre, 25 mar de 2002. p.4.

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